Resumo da postagem

Entenda o que é bullying e como lidar com ele na escola pública.

O bullying é uma forma de violência interpessoal caracterizada por agressões intencionais, repetitivas e que envolvem desequilíbrio de poder, seja físico, psicológico, social ou simbólico. Pode ocorrer por meio de apelidos, exclusões, ameaças, humilhações, empurrões, cyber ataques e outras formas de abuso. 

Segundo a Lei nº 13.185/2015, que instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying) no Brasil, trata-se de “todo ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo, praticado por indivíduo ou grupo contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidar, agredir ou humilhar”. 

Na escola pública, onde convivem crianças e adolescentes de realidades socioculturais diversas, o bullying assume contornos ainda mais complexos. Muitas vezes, é reflexo das desigualdades sociais, raciais, de gênero e territoriais.  

Mais do que uma questão de comportamento individual, o bullying é um problema social e educativo, que exige olhar atento dos profissionais da educação, pois interfere diretamente na aprendizagem, na saúde mental e na permanência escolar.

Violência crescente nas escolas brasileiras

Dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) mostram que o Brasil enfrenta um aumento preocupante nas ocorrências de violência dentro do ambiente escolar.

Em 2013, foram registradas 3,7 mil vítimas de violência interpessoal em escolas brasileiras; já em 2023, esse número saltou para 13,1 mil, um crescimento de mais de 250% em uma década

Segundo pesquisa da Fapesp, apoiada pelo MEC, o ambiente escolar é hoje impactado por quatro tipos principais de violência

  1. Agressões extremas, como ataques letais premeditados.
  1. Violência interpessoal, que inclui hostilidades e discriminação entre alunos e professores. 
  1. Bullying, envolvendo intimidações físicas, verbais ou psicológicas repetitivas. 
  1. Violência institucional, quando práticas da própria escola reforçam exclusões, como materiais didáticos que ignoram a diversidade racial e de gênero. 

Além disso, o Atlas da Violência (2024) mostra que o percentual de alunos que relatam sofrer bullying auentou de 30,9% em 2009 para 40,5% em 2019. No mesmo período, a proporção de estudantes que deixaram de ir à escola por medo ou insegurança mais do que dobrou, passando de 5,4% para 11,4%

Esses números revelam um alerta: a violência escolar no Brasil não é mais um fenômeno isolado. Ela é parte de uma crise de convivência e de valores, alimentada por discursos de ódio, desvalorização do magistério e falta de políticas permanentes de formação cidadã. 

O bullying também afeta quem o pratica. O agressor, frequentemente, reproduz padrões de violência observados em casa, na comunidade ou nas redes sociais. A escola, portanto, deve atuar não apenas para punir, mas para reeducar comportamentos e desenvolver competências socioemocionais.

O papel da escola pública na prevenção do bullying

A escola pública brasileira é, historicamente, um espaço de inclusão, convivência e formação cidadã. Por isso, tem papel estratégico na prevenção e no enfrentamento do bullying. Essa missão envolve toda a comunidade escolar: professores, equipe gestora, famílias, estudantes e profissionais de apoio.

1. Construir uma cultura de respeito e pertencimento

A prevenção começa na cultura escolar. É preciso construir um ambiente em que as diferenças sejam valorizadas e o respeito seja um valor cotidiano. Atividades coletivas, assembleias escolares, projetos de convivência e rodas de conversa são estratégias eficazes. 

A BNCC (Base Nacional Comum Curricular) reforça a importância do desenvolvimento socioemocional, especialmente nas competências 8, 9 e 10, que tratam do autoconhecimento, da empatia e da responsabilidade social. Trabalhar esses valores de forma intencional é essencial para fortalecer o clima de confiança e acolhimento.

2. Capacitar os professores

Os educadores da rede pública muitas vezes enfrentam turmas superlotadas e carência de formação continuada em temas socioemocionais. Por isso, a formação docente deve incluir práticas de mediação de conflitos, comunicação não-violenta e escuta qualificada. 

3. Integrar o tema ao currículo

O combate ao bullying não deve ser tratado apenas em datas comemorativas. É fundamental integrar o tema ao currículo, em disciplinas como Língua Portuguesa, História, Educação Física e Ensino Religioso, por meio de projetos interdisciplinares. 

Leituras de obras literárias que abordem empatia e diversidade, dramatizações e produções audiovisuais podem ajudar os estudantes a refletir sobre suas atitudes e reconhecer o valor do outro

Conheça alguns exemplos de boas práticas contra o bullying: 

  • Esporte e cooperação: promover torneios e jogos cooperativos que valorizem o trabalho em equipe e o respeito mútuo, substituindo a lógica da competição pelo espírito de colaboração. 
  • Cultura e expressão: incentivar apresentações artísticas, rodas de leitura e produções teatrais que abordem temas como empatia, diversidade e convivência. 
  • Rodas de conversa: criar momentos regulares de diálogo entre alunos, educadores e famílias, para escuta ativa, mediação de conflitos e fortalecimento dos vínculos. 
  • Campanhas de conscientização: desenvolver murais, vídeos e podcasts produzidos pelos próprios estudantes com mensagens de respeito e solidariedade. 
  • Projetos interdisciplinares: integrar o tema às disciplinas, como em atividades de redação sobre convivência, debates em História sobre cidadania ou reflexões éticas em Ensino Religioso. 
  • Educação emocional: incluir dinâmicas de autoconhecimento, empatia e regulação emocional na rotina escolar, fortalecendo o senso de comunidade e acolhimento.

Essas ações contribuem para formar uma cultura escolar baseada no respeito, na escuta e na valorização das diferenças — elementos essenciais para prevenir o bullying e promover uma convivência mais saudável.

4. Criar canais seguros de denúncia e acolhimento

Muitos estudantes não relatam o bullying por medo de retaliações. Por isso, é importante que as escolas públicas criem espaços seguros e confidenciais de escuta

A presença de profissionais de psicologia e serviço social na rede pública — garantida pela Lei nº 13.935/2019 — é uma conquista importante e deve ser fortalecida pelos gestores escolares. 

Além disso, parcerias com o Conselho Tutelar, CRAS e Ministério Público ajudam a dar encaminhamento adequado aos casos mais graves. Também temos o Centro Marista de Defesa da Infância, que desde 2010 atua na proteção e defesa de crianças e adolescentes.

Bullying e o desafio do ciberespaço

O avanço das tecnologias trouxe um novo campo de atenção: o cyberbullying. Com celulares e redes sociais, a violência ultrapassa os muros da escola e ganha proporções virais. 

É essencial que educadores da rede pública abordem o uso ético e responsável das tecnologias com seus alunos. Projetos de educação midiática, como os desenvolvidos pelo NIC.br, SaferNet Brasil e o Programa EducaMídia, oferecem materiais gratuitos para trabalhar cidadania digital, empatia online e combate à desinformação.

Sinais de que um aluno pode estar sofrendo bullying

A seguir, alguns dos principais indicadores emocionais, comportamentais e escolares que podem apontar para situações de intimidação:

1. Mudanças súbitas de comportamento

O aluno antes participativo passa a se isolar, fica calado nas aulas, evita o recreio ou atividades em grupo. Pode se tornar excessivamente ansioso, irritado ou apático. 
Essas alterações indicam que algo emocional está em desequilíbrio e o bullying é uma das hipóteses mais comuns. 

 2. Queda no rendimento escolar

A vítima tende a perder o foco e o interesse pelas atividades. As notas diminuem, as tarefas deixam de ser entregues e há faltas frequentes. Em casos mais graves, o estudante pode abandonar a escola por medo ou vergonha.

3. Queixas físicas recorrentes

Dores de cabeça, náuseas, problemas gastrointestinais e distúrbios do sono são sintomas psicossomáticos comuns em vítimas de bullying. Também é importante observar hematomas ou machucados não explicados, sinais possíveis de agressão física.

4. Alterações emocionais e de autoestima

O aluno demonstra insegurança, medo constante, vergonha de falar em público ou expressa frases de autodepreciação (“ninguém gosta de mim”, “sou um fracasso”). Pode apresentar crises de choro ou momentos de silêncio prolongado.

5. Isolamento social

Vítimas de bullying frequentemente evitam interações com colegas. Podem comer sozinhas, fugir de rodas de conversa, trocar de turma ou inventar desculpas para não participar de excursões, festas e projetos coletivos.

6. Medo do celular ou das redes sociais

No caso do cyberbullying, é comum o aluno demonstrar medo, irritação ou vergonha ao usar o celular. Pode pedir para faltar após um vídeo, foto ou comentário ofensivo viralizar entre colegas.

O papel do professor e da escola pública na identificação precoce do bullying

Os profissionais da rede pública têm um papel fundamental na observação cotidiana e no acolhimento. Diferentemente de outros contextos, o vínculo com os alunos é contínuo, o que permite perceber nuances e mudanças sutis.

1. Crie espaços de confiança

Os estudantes precisam sentir que podem falar sem medo de punição ou julgamento. Rodas de conversa, assembleias de classe e projetos de convivência ajudam a criar um ambiente seguro para que o aluno expresse o que vive. 

2. Observe as dinâmicas de grupo

O bullying raramente é um ato isolado. Ele envolve testemunhas e espectadores que reforçam, riem ou silenciam. Observe quem domina a turma, quem é alvo de piadas e como os colegas reagem às provocações. 

3. Trabalhe a escuta ativa

Ao perceber um sinal, converse com o aluno de forma reservada, empática e sem pressa. Pergunte como ele se sente, se algo está incomodando, e assegure que a escola o apoiará. A escuta acolhedora pode salvar vidas.

4. Registre e comunique

Toda suspeita deve ser comunicada à equipe gestora e registrada oficialmente. Esse registro é importante para o acompanhamento psicossocial e a proteção legal da vítima e da escola.

5. Envolva a rede de apoio

A escola pública pode contar com psicólogos e assistentes sociais (Lei nº 13.935/2019), além de CRAS, CAPS e Conselho Tutelar. Esses devem ser acionados sempre que houver risco à integridade física ou mental do aluno. 

Sinais de alerta grave: quando agir imediatamente

Algumas manifestações exigem intervenção urgente: 

  • Frases de desesperança (“não aguento mais”, “ninguém se importa comigo”); 
  • Automutilação, ferimentos ou tentativas de suicídio; 
  • Ameaças explícitas de violência; 
  • Postagens em redes sociais com mensagens de ódio, dor ou despedida. 

Nesses casos, é essencial acionar imediatamente a gestão escolar, os serviços de saúde mental e o Conselho Tutelar. O sigilo deve ser preservado, mas a omissão não é uma opção.

O papel da empatia na luta contra o bullying

Mais do que reagir ao bullying, a escola deve cultivar diariamente a cultura do respeito e da empatia. Isso passa por políticas permanentes de convivência, projetos sobre diversidade e ética, e um trabalho coletivo entre professores, famílias e estudantes. 

Práticas simples, como elogiar atitudes solidárias, promover trabalhos em grupo com trocas positivas e incluir todos os alunos nas atividades, têm impacto real na redução de casos de violência. 

Como afirma o educador Paulo Freire, “não há saber mais ou saber menos: há saberes diferentes”. Essa visão deve guiar a convivência escolar: reconhecer e valorizar o outro é o antídoto mais eficaz contra o bullying.

Trabalhar com as famílias: parceria essencial

O combate ao bullying também depende do envolvimento das famílias. É fundamental promover reuniões, rodas de conversa e campanhas de conscientização sobre respeito e convivência. 

A escola pode incentivar os responsáveis a observarem o comportamento dos filhos e a manterem diálogo aberto e afetivo, reforçando valores de solidariedade e respeito.

Prevenir é educar para o cuidado

Lidar com o bullying é mais do que conter conflitos: é formar cidadãos conscientes, empáticos e solidários. Nas escolas públicas brasileiras, essa missão é ainda mais relevante, pois significa garantir o direito à educação em um ambiente seguro, inclusivo e democrático

O combate ao bullying exige compromisso coletivo: do professor à comunidade, da sala de aula às redes sociais. Cada gesto de acolhimento, cada palavra de respeito e cada projeto de convivência plantam as sementes de uma cultura de paz. 

Educar contra o bullying é, acima de tudo, educar para o amor e para a dignidade humana.

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